domingo, 7 de janeiro de 2018

Um Deus Menino


Ano passado, um vizinho me deu duas imagens que ele guardava há muito tempo e nunca tinha colocado em sua casa: um São Roque e este Deus Menino. Que presente! Quase dou um treco! Entrei em transe, êxtase místico, me tremi, quase me ajoelho para agradecer. Enlouqueci com o Deus Menino de 31 cm, escultura perfeita, lindo e bem preservado.
Fui a um marceneiro e encomendei um cubo de 7/7 de  vinhático para servir como base/peanha. Vi num antiquário da rua um monte/peanha, mas não queria fazer uma cena maior e nos conformes com o meu Deus Menino, queria ele assim, nu, em cima de um cubo simples que iria realçar a beleza da escultura.
Coloquei logo em minha sala - em local improvisado - porque queria passar sempre por ele e dar uma olhada e, Ele, é claro, me olhar também... Apaixonei-me pelo Menino Deus perdidamente.
Para evitar poeiras e outras coisinhas más, providenciei um vaso de vidro, desses que se usa para fazer arranjos de flores como proteção, pois as cúpulas e redomas deixaram de fabricar e, as que ainda são vendidas na praça, são mais caras que os santos que venham abrigar.
Deixei ele nuzinho dentro do vaso/cúpula/redoma em um local que, sei, ainda não é o definitivo, mas o queria à vista, bem à vista.
Ontem me lembrei que um amigo, Walter, tinha me dado há muitos anos, uma roupinha para um Deus Menino e que eu guardei em uma caixinha. Pois bem, a roupinha caiu como uma luva, parecia que tinha sido feita de encomenda para ele. Vesti, "compus" o Deus Menino e ficou ótimo! A roupinha está bem amarelada, o tecido manchado pelo tempo, mas é assim que eu gosto, talvez eu dê uma passadinha de ferro só para esticar o tecido e a renda, mas lavar, não. O bordado é lindo, bolinhas bordadas em ponto cheio e, outras, vazadas e contornadas com ponto simples, não o ajour.
É isto!
Passado um tempo, dei para o meu vizinho querido em retribuição, uma travessa inglesa com decoração de flores que eu  guardava há séculos e nunca soube onde colocar. Ele amou e arranjou logo um posto na parede do apartamento dele. E o Deus Menino, que ele não sabia como usar, acabou em minha companhia, em meu coração e em destaque na minha sala. 
E assim, tudo se ajeitou, as pedras rolaram e acharam os seus paradeiros.




Elegantérrimo! Será de Poiret a roupinha dele? Não, deve ser de uma prendada de mãos de fada e nascida na Bahia mesmo. As bolinhas vazadas ficam só na frente, as outras são cheias. E o bico rendado é francez, com certeza.












Por enquanto vou mantê-lo vestidinho. De vez em quando, deixarei nu. O que importa é que já está protegido pelo bendito vaso/redoma de vidro.




Abaixo, outros Deus Meninos que tenho aqui em casa - todos já postei aqui. O primeiro coloquei em uma madeira pregado com cola leve e coloquei na parede. Walter me deu a ideia de pintar a base de madeira em azul rei, colonial, mas preferi não mexer com tinta, vai que eu me arrependo e retirar tinta é um porre. Mas, ficaria bonito.


Os dois abaixo estão em uma estante/vitrine que, eu acho, será o local onde deverei colocar o meu novo Deus Menino. Mas, antes preciso apartar muitas velharias que ali já estão abrigadas.


6 comentários:

  1. Uma história muito bonita. Uma travessa inglesa e um Deus Menino que trocam de casa, dando-lhes os seus donos um sentido, que só quem gosta é capaz de dar.
    Gosto dos pratos que vejo lá atrás e da majólica onde está pousada a figura de Jesus.Interessante o despojamento da base que idealizou e muito criativa a solução da jarra a servir de redoma. As bolinhas vazadas bem no centro do vestido não serviriam para passar alguma fitinha que acabaria em pequeno laço? Gosto de tudo o resto que consigo ver.
    Um abraço.

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  2. Olá, Maria Paula, esses são os bons acasos da vida, prazeres trocados.
    Os pratos atrás são ingleses e também da cerâmica brasileira Matarazzo com o motivo "pombinho" que eu gosto demais. Gosto das decorações em
    azul. A travessa em faiança alemã é enorme e está em local errado. Ela é quase do tamanho do tampo da mesa e esconde a marchetaria. Preciso arranjar um lugar melhor para ela...pendurar na parede.
    Vou fazer um post dela aqui.
    As bolinhas vazadas, tipo ilhoses bem podem ser para passar uma fitinha, ou duas, encontrando em cima e dando um lacinho. Não tinha pensado nisso.
    Que bom que gostamos de boas velharias.
    Um abraço.

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  3. Jorge

    Gostei do seu menino Jesus, que é tão simples, que parece uma daquelas histórias antigas, do menino pobre que andava pedindo na rua e que afinal era Deus Nosso Senhor. O Menino parece de facto bastante antigo e a roupinha que lhe arranjou ficou uma graça. Creio que a Maria Paula tem razão, os furinhos deveriam ser para passar uma fita, que faria um laçarote, para cingir a cintura do menino. Gostei de ver também os seus outros Meninos Jesus e ainda bem que o Jorge resiste a tentação de mandar repintar e retocar as peças. Eu também gosto de ver as marcas do tempo.

    Um abraço

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  4. É, Luís, o Deus Menino é bem antigo, deve ser do início XIX, não?? Acontece que ele está com um grandes desprendimento da parte que reveste a madeira- a cola de carneiro misturada ao gesso - onde depois é colocada a tinta da cor da pele. É caso de se fazer uma boa intervenção para que não se agrave. Por enquanto a roupinha vai disfarçando o desgaste do tempo.
    Preciso estudar a roupinha que ele usa, para poder entender como passar uma fita e apertar a cintura. Quantas preocupações, não é Luís??kkkk
    É claro que não mando macacar as minhas imagens, quando muito, faço retoques que as aproximem do original.
    As imagens domésticas aqui na Bahia estão acabando, os falsos restauradores compram e repintam. Tem um que eu conheço que "ferve" a imagem em uma panela, a tinta se desprende e ele repinta. É um assassino.
    Tenho um ex professor que restaura fazendo prospecções nas imagens em um trabalho muito criterioso. Se tem algo que se salve por baixo de camadas de tintas que descaracterizaram as imagens, ele prossegue e ressurge a original e só aí ele retoca. Mas esse trabalho é uma fortuna.
    Recentemente comprei uma Nossa Senhora da Conceição do XVIII, as vestes e o véu voam ao vento, uma coisa linda, mas está toda repintada, inclusive os olhos de vidro pintados. Vou gastar toda a minha fortuna para restaurá-la, venderei minhas propriedades, kkkk
    Abraços do XVIII.

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    1. Jorge

      O menino parece antigo. Assim no ar, diria que seria finais do XVIII, inícios do XIX, mas é complicado ter certezas, porque o gosto barroco sobreviveu até tarde no Brasil e em Portugal. Os santeiros repetiam formas antigas, que eram ao gosto barroco dos crentes.

      Concordo consigo. As imagens antigas ou se entregam a bons restauradores ou é melhor estar quieto e deixa-las com as suas mazelas. Por aqui também vejo nas feiras de velharias verdadeiros crimes, com imagens antigas todas pintalgadas, com tintas acrílicas e até em igrejas há verdadeiros atentados. Há uns tempos o Manel e estivemos numa igreja alentejana, onde existia um pequeno museu de arte sacra, com imensas imagens de roca. Os restauros eram de tal ordem, com as imagens pintadas com tintas modernas, que tive que sair rapidamente do Museu, para não insultar a Senhora, que nos facultou a entrada e dizer-lhes que que tinham feito um crime grave contra o património.

      Um abraço

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    2. Concordo com o período. E ele está bem conservado,no rosto pode ter um pouco de nova tinta, com cara de anos 30. Mas tô preocupado com o desprendimento da camada pictórica, urge frear!!!
      Aqui também fazem misérias com as imagens, tanto com as domésticas quanto as de igrejas, restauros absurdos que dá vontade de chorar!
      tenho um São Roque que comprei pela escultura e por imaginar que embaixo das tintas novas que colocaram tem restos da original. E tem, só que para tirar, tá difícil. O santo ficou hilário, parece um boneco, medonho.
      Ontem tive uma agradabilíssima surpresa ao visitar a igreja de São Domingos que ficou décadas em estado deplorável e depois do restauro total ficou excelente, escandalosamente linda. Fotografei. Lá tem muitas imagens de roca espanholas, esculturas perfeitas, lindas e o restauro ficou perfeito!!! Quero jogar as fotos aqui, fiquei feliz. Agora quero ir na igreja de Santana que também foi restaurada de cima abaixo e, dizem, estar deslumbrante.
      Luís, obrigado por suas observações e comentários sempre legais.
      Adorei o seu "ataque" na igreja alentejana kkkk. Eu tenho vontade de gritar quando vejo as misérias que fazem. Tratam as imagens de madeira antiga como se fossem de simples gesso. Argh!
      Um abraço.

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